quarta-feira, 17 de agosto de 2011

De perto ninguém é normal

O mundo era muito melhor antes de certos avanços científicos, a vida era mais simples.
Não esqueço do dia em que um aluno teve um acesso de fúria na minha aula, me ameaçou e tentou me ofender, e, obviamente, tive que pedir que se retirasse da sala de aula, ao menos para acalmar os ânimos. Não demorou nada para a psicóloga da escola vir falar comigo, pedindo que eu tivesse muito cuidado, pois aquele aluno, entre outros transtornos, apresentava o que ela chamou de TDO - Transtorno Desafiador/Opositor, e que isso provocava atitudes como a que ele tomou na minha aula. Com um sorriso, e com muita paciência, expliquei à distinta psicóloga que não haveria problemas, aquela não era primeira dificuldade que eu encontrava em sala de aula, e que aquilo seria facilmente resolvido. Após algumas recomendações, ela me considerou apto a lidar com as dificuldades do aluno, e pude seguir meu trabalho.
Ora, disseram meus colegas mais velhos, "antigamente, isso aí era má-criação, e se resolvia era com pulso firme, disciplina", conselho que também acolhi com um sorriso. Imaginei como a psicóloga receberia um comentário dessa natureza, certamente pensaria que o autor era um ignorante, que contribuiria para o desenvolvimento dos problemas do garoto.
Fiquei pensando em quanto de razão tinha cada um dos colegas que falou comigo, e pensando ainda em quantos outros transtornos, todos abreviados por siglas difíceis de decorar as psicólogas da escola já haviam citado para que os professores tivessem uma atenção diferenciada a cada caso.
E cheguei à conclusão de que alguns avanços científicos são mesmo um problema. Vivemos em uma sociedade que confunde ciência com verdade, e que acha que pode explicar quase tudo pela natureza química/física/biológica/médica das coisas. Como se os discursos científicos não fossem tão contraditórios quanto os discursos políticos, como se as verdades científicas não fossem muito mais instáveis do que qualquer verdade.
Não se pode discutir com um psiquiatra a menos que você seja um. Os médicos possuem uma autoridade quase infinita na nossa sociedade, porque são eles que sabem o que é melhor para nós. E nos entopem de drogas, ou nos oferecem as mais variadas privações, tudo para o nosso bem estar.
Pois bem, eu estou farto de médicos. [Principalmente de um que está diariamente na televisão apontando os caminhos para uma maior qualidade de vida, só não sei qual é o padrão de qualidade de uma vida onde você não pode fazer nada que gosta.]
Como disse um sábio baiano, de perto, ninguém é normal. Eu creio nisso, e creio que todas as pessoas possuem transtornos mentais, isso não é um caso de saúde, ou então é uma doença inerente à vida humana, como a morte. 
Creio, portanto, que todos os meus alunos precisam, assim como aquele aluno que apresentava o tal do TDO, de uma atenção diferenciada, porque cada um é uma pessoa diferenciada!
E cada ser humano tem os seus complexos, as suas frustrações, como saber qual é o limite da normalidade? O limite é até o momento em que os transtornos passam a atrapalhar as atividades cotidianas, explicou sabiamente uma assistente social muito íntima das questões de saúde mental.
E então, quer dizer que existem super-heróis nesse mundo que conseguem evitar que os seus problemas mentais afetem, a qualquer custo, as suas atividades? Alguém por favor me apresenta uma máquina dessas, porque eu ainda não conheci nenhuma.
É óbvio que as pessoas tem maneiras diferentes de lidar com os problemas, é óbvio que há os que se saem melhor [ao menos por fora] e os que são mais sensíveis, mas se ser mais sensível aos problemas fosse doença, teríamos que entupir de remédios todos os artistas, e aniquilar toda a sua produção do mundo também. E todos os artistas são loucos?
Eu acho, humildemente, que o que falta aos profissionais da saúde mental é serem menos profissionais e mais humanos, é preocuparem-se menos com compostos químicos, estatísticas e modelos comportamentais e mais com as palavras, com os gestos. Acho, sim, que os efeitos de palavras e atitudes no cérebro humano são mais eficazes e duradouros que qualquer droga, ainda com a vantagem de serem mais baratos.
Perdoem-me os profissionais da saúde, eu gosto de não ser normal. Gente é pra viver, não é pra ser normal.
E os que pensarem que eu digo isso porque não sofro com nenhum transtorno mental sério, por favor, façam aquelas facas na minha cozinha pararem de ser tão atraentes.

P.s.: Não posso esquecer de mandar um abraço ao queridos Raul Seixas, Caetano Veloso, John Nash e Erasmo de Roterdã, adoráveis malucos beleza.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

O homem que amava as mulheres

Ou a canção da autobiografia plagiada:

Ele é uma pessoa com um espírito bastante crítico e analítico. A sua orientação vai para o pormenor e atividades secundárias. Bastante engenhoso, finório, prudente, astuto.
As suas palavras são bem escolhidas e sutis. É uma pessoa muito diplomática.
Espírito mesquinho, tendência para a crítica. É meticuloso, esmiuçador, extremamente minucioso.

E isto vai piorando com a velhice.

Ideal superior. Tem aptidão para línguas estrangeiras. Não gosta da solidão, mas quer sempre ser livre em primeiro lugar. A sua originalidade é um pouco extravagante. Provavelmente muito pouco sensível à ternura. Estilo de homem que aprecia as mulheres sensuais. Abusa dos prazeres carnais, volúpia, grande atividade sexual.

E isto vai piorando com a velhice.

Boa popularidade, carreira pública. Tem medo de envelhecer. Êxito graças a ajudas femininas. Tem aptidão para comparar e avaliar, a sua apreciação é excelente, exprime-se com clareza. É negligente e fleumático. O seu cônjuge pode lhe ser infiel. O seu conforto é muito importante. É inteligente, fala com facilidade.

E isto vai piorando com a velhice

As amizades são sinceras, francas, cordiais, é uma pessoa muito carinhosa. Adora ter debates com amigos com ideias diferentes das suas, conduz a discussão aonde quer, destrói os nervos do adversário, é agressivo, ofensivo e provocador. Gosta das paixões, de saboreá-las, tem tendência para a falsidade. Seduz pelo prazer de seduzir, para provar que sabe agradar. Mas não é calmo nem tranquilo.

E isto vai piorando com a velhice

As suas ideias são inconstantes, o seu humor também. Espírito limitado e tacanho. Detesta as tagarelices, o barulho do exterior. Sabe portar-se à altura de qualquer situação. Bastante engenhoso e original, grande senso prático de tudo. Sempre perde mais do que aquilo que tem. É tímido e orgulhoso, delicado e vivo.

E isto vai piorando com a velhice.

Tem boa educação e fala muito bem. Gosta de viajar e de escrever. Ouve muito pouco os outros, gosta mais de se ouvir falar. Gosta de crianças e é feliz com elas, talento de educador. Austeridade, inclemência, rigor, insensibilidade. Acidentes em deslocações. Utiliza demasiadamente sua energia. Irrita-se com facilidade. Age duas vezes antes de pensar.

E isto vai piorando com a velhice.

Achei no bolso da calça

Uma letra de canção que eu fiz faz tempo, e fiz de novo:

Pra você não

Eu bebo um gole d’água do chuveiro

Na fumaça do cigarro, meu amigo

Me diz tranquilo que eu não minto

Quando o sol emperra ao meio dia

O gosto do teu beijo me revela

Uma cor de sal azul celeste

Calor do mau amor que tu me deste

Enquanto eu finjo que não dói

Disseram que a vida é assim

Cada coisa em seu lugar, não é comigo

Só sei sentir, eu nunca me absinto

Eu fiz tanta bagunça por você

Me deu tanta preguiça de arrumar

Alguém aí viu os pedaços

Que eu queimei sabendo que ia arder

Eu te queimei pra cicatrizar

Tá vendo essa canção

Eu fiz pra você não ouvir

E quando ela tocar no seu rádio

Por favor ache um motivo pra sair