sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Manifesto autofágico

Quero fugir de mim mesmo. Porque ser uma coisa só, uma vez só, não me basta. Quero fugir de mim mesmo por ter a minha alma tão gasta... Porque estou vestido, de roupas e títulos e instituições, quero fugir de mim mesmo. Porque uma vez só é nunca, quero viver muitas vidas. Quero que doam as feridas, e quero curá-las. Quer uma vida tranquila, e quero arriscá-la. Quero fugir de mim mesmo porque nunca coube em mim. Quero fugir do conforto, e assim, quero perder-me em mim mesmo. Quero o privilégio de não ter razão, de não conhecer o pudor, de não ter coração. Quero fugir de uma vida correta.
Transgredir a linha reta. Quero meu corpo e meu canto torto. Quero que, antes de morto, eu tenha vivido sem fim. Quero cortar os meus pulsos, desde que conserve os impulsos, quero ser outros em mim... Porque estou preso a uma vida, eu plural; quero ir além do normal. Quero ser tantos em mim. Que não sou de me ocupar, como as pessoas da sala de jantar. Talvez eu só queira nascer. Sem morrer. Sem nada nas mãos ou no bolso, sem senso, sem documento. Quero fugir da casa onde eu moro sozinho. Quero errar meu caminho, e ainda mais. Eu sou apenas um rapaz, agindo, acreditando. Acertando e errando. Eu quero vagar pelo mundo. No fundo, no fundo, eu imundo e puro, só quero em cima do muro, e nas três margens do rio. Que pra preencher meu vazio, uma vez é nunca. Uma vez é jamais ter vivido..

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